Pirataria no setor óptico causa prejuízo de R$ 10,2 bilhões
- 28 de jul.
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Governo Federal perder bilhões em impostos, alimentando o crime organizado e colocando em risco a saúde ocular dos brasileiros.

Quem circula pela Avenida Sete de Setembro, no Centro de Salvador, encontra com facilidade óculos escuros e de grau com design similar, mas nem tanto, ao de marcas consagradas, por preços que variam entre R$ 20 e R$ 50. O que parece ser apenas uma oferta tentadora esconde, no entanto, um problema de proporções nacionais. A comercialização de produtos falsificados não só desestrutura o setor produtivo óptico, mas também financia o crime organizado, faz o governo federal perder bilhões em impostos, desemprega milhares de pessoas que poderiam estar atuando legalmente e, ainda pior, coloca em risco a saúde visual e óptica de milhões de brasileiros.
O setor óptico brasileiro está imerso em uma realidade que se agrava a cada ano. Segundo a Abióptica – Associação Brasileira das Indústrias Ópticas –, a pirataria causou um prejuízo de R$ 10,2 bilhões ao setor em 2024. Esse valor corresponde a cerca de 40% do faturamento do segmento, estimado em R$ 27 bilhões. Para a entidade, esses números são mais do que alarmantes. “Essa realidade é devastadora para toda a cadeia produtiva óptica. É uma rede de prejuízos. O consumidor perde, a indústria perde, o varejo sério perde, o Estado perde. Não estamos falando apenas de um mercado paralelo, mas de um ciclo vicioso que impacta toda a economia, além de prejudicar a saúde pública”, resume Ambra Nobre Sinkoc, diretora executiva da Abióptica.
Ambra, com a experiência adquirida ao longo de anos de trabalho no setor, observa que a pirataria no setor óptico é um problema que vai muito além do simples comércio de produtos ilegais. “Não existe nenhuma fábrica nacional de óculos piratas. 100% desse material vem de fora do Brasil, maior parte da Ásia, e entra por meios ilegais. Esse é um problema de fronteira, de contrabando, de segurança pública. Trata-se de uma rede criminosa organizada, com ramificações internacionais que precisam ser combatidas de forma integrada entre os países envolvidos”, alerta Ambra.
O impacto da pirataria no Brasil, de acordo com ela, não é apenas econômico, mas também um problema de saúde pública. “Estamos falando de um órgão sensível e essencial, que é o olho humano. Óculos falsificados não oferecem proteção contra os raios ultravioleta, o que pode causar danos irreversíveis à visão. Entre as consequências mais comuns estão a ceratite, conjuntivite, queimaduras e lesões na retina, que podem levar a problemas permanentes de visão. O que muitos consumidores não sabem é que ao optar por esses produtos, estão colocando a saúde ocular em risco”, explica Ambra.
Ela enfatiza que a falta de fiscalização e o enfraquecimento da segurança nas fronteiras alimentam o comércio de produtos falsificados, criando uma rede que afeta o mercado de trabalho e a qualidade de vida dos brasileiros. “Quando o mercado de produtos falsificados cresce, os empregos formais desaparecem. O mercado de óculos falsificados não gera empregos sustentáveis ou que ofereçam proteção ao trabalhador. O que vemos são pessoas sendo exploradas em um sistema informal que cresce às sombras da pirataria”, ressalta Ambra.
No entanto, a pirataria no setor óptico não é um problema isolado. Ela está profundamente ligada ao crime organizado, que utiliza as redes de contrabando de produtos falsificados para financiar outras atividades ilícitas. “As redes de pirataria no setor óptico estão diretamente conectadas com as redes que trafegam armas, drogas e cigarros. A pirataria não é um crime simples e de baixo custo. Ela movimenta bilhões de reais, com rotas internacionais bem definidas, e está diretamente relacionada à criminalidade organizada que é difícil de combater sem uma ação coordenada entre os países", explica Ambra.
A responsabilidade do Governo Federal e a luta pela fiscalização eficaz.
A Abióptica, ciente da gravidade da situação, tem trabalhado incansavelmente para trazer esse problema à tona nas esferas políticas, especialmente no Governo Federal e no Congresso Nacional. “Estamos fazendo uma articulação nacional para pressionar o governo a agir de forma mais firme contra a pirataria. Não é mais uma questão local ou estadual. Precisamos de uma ação coordenada entre as autoridades federais e estaduais para combater essa prática criminosa, que afeta não apenas a economia, mas a saúde pública e a segurança do país”, afirma Ambra.
Ela destaca que as negociações com o Governo Federal e a Câmara dos Deputados têm sido intensas. "Estamos dialogando com a Receita Federal, com a Polícia Federal, e com outros órgãos federais para que a fiscalização nas fronteiras e no mercado interno seja mais eficiente. No entanto, essa articulação ainda enfrenta muitos obstáculos. O problema não é a falta de leis, mas a falha na aplicação dessas leis", revela.
Ambra também aponta que o combate à pirataria no Brasil enfrenta um grande desafio relacionado à corrupção e à falta de integração entre os diferentes órgãos responsáveis pela fiscalização. “Infelizmente, ainda lidamos com uma realidade em que a fiscalização é fragmentada, ineficaz e, em alguns casos, até corroída por corrupção velada. Existe uma resistência, uma falta de comprometimento em combater o contrabando de produtos falsificados de forma sistemática. Isso enfraquece as ações e permite que redes criminosas operem com impunidade", denuncia Ambra.
Para a executiva da Abióptica, a solução passa por uma maior integração entre os órgãos responsáveis pela fiscalização e pelo fortalecimento das políticas públicas. “Não podemos continuar permitindo que o problema seja tratado de forma superficial. O Brasil precisa de uma abordagem mais séria e integrada. . O combate à pirataria exige mais do que apenas ações pontuais. Precisamos de uma política pública que envolva a Polícia Federal, a Receita Federal, os governos estaduais e municipais, além das entidades do setor privado, como a Abióptica, para que as operações de fiscalização sejam realmente eficazes”, afirma Ambra.
A Abióptica tem buscado, ainda, um trabalho conjunto com outros setores da sociedade, como entidades de defesa do consumidor e associações de saúde ocular, para aumentar a conscientização sobre os riscos da pirataria. “É fundamental que o consumidor se conscientize de que o preço baixo de um óculos pirata não compensa o risco para a saúde ocular. A informação é um dos maiores aliados dessa batalha. Por isso, temos intensificado nossa participação em feiras e eventos, como a Expo Abióptica, para educar o público e apresentar alternativas seguras e de qualidade”, ressalta Ambra.
Tecnologia - Em paralelo, a Abióptica tem investido na utilização da tecnologia para combater a pirataria. Durante a Expo Abióptica, a associação lançou uma plataforma de rastreabilidade por QR Code, uma ferramenta que permite ao consumidor verificar a origem do produto e garantir sua autenticidade. “Com o avanço da tecnologia, é possível rastrear a procedência dos óculos e garantir que o consumidor esteja adquirindo um produto legalizado. A rastreabilidade por QR Code é um passo importante para garantir que os consumidores não sejam enganados e que a saúde ocular seja preservada”, afirma Ambra.
A rastreabilidade não é apenas uma questão de proteger as grandes marcas, mas de garantir que os consumidores tenham acesso a produtos de qualidade. “O objetivo não é apenas proteger a indústria, mas garantir que as pessoas tenham acesso a produtos que realmente oferecem a proteção necessária para a saúde ocular. Óculos de baixa qualidade, além de não protegerem contra os raios ultravioleta, podem causar problemas sérios como catarata, glaucoma e até perda da visão”, alerta Ambra.
Governo - A Abióptica, ciente de seu papel como articuladora do setor, reafirma a importância de uma ação conjunta entre a indústria, o Governo Federal e as autoridades competentes para erradicar a pirataria. “A pirataria no setor óptico é um problema complexo, que exige uma abordagem multifacetada. Precisamos de um esforço coordenado entre a indústria, os órgãos de fiscalização e os consumidores. O governo federal tem um papel central, e sua ação efetiva é crucial para que o Brasil possa combater o contrabando de óculos falsificados de forma eficaz”, conclui Ambra.



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